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Menos ousadia, por favor, Professor Unger


É tão brasileiro e previsível quanto os Refis: a cada crise,  vozes alertam que é a hora de aproveitar o momento para ampliar a intervenção do Estado para o Brasil dar um salto adiante.
 Nesta crise do coronavírus, o  Professor Mangabeira Unger é - sem surpresa - um dos mais loquazes.  Em  " Brasil tem que renovar agenda e ousar para ser grande" , ele defende o que chama de um  "projeto forte" para o Brasil.  A retórica de Unger é sedutora; o tom, messiânico;  o desejo de contribuir para o Brasil, sincero; e os planos, ambiciosos. Contudo, ele persiste desconectado da realidade brasileira.
Adianto que , sabendo ou não, o  Professor se guia por uma interpretação da história econômica brasileira chamada  "teoria dos choques adversos". Essa visão - tão questionável quanto popular-  sustenta que os momentos de crise internacional são oportunidades  áureas para o desenvolvimento nacional. A I Guerra Mundial, a Grande Depressão e o Choque do Petróleo teriam sido saltos para outros patamares.  Mais recentemente, ouvimos essa ladainha no pós-crise de 2008 . (E todos sentimos o dano causado pelo governo Dilma ao empurrar a economia brasileira, em marcha forçada,  ladeira acima, depois da crise).
Volto ao texto do Professor e tento reproduzir seus argumentos. Ele enaltece as décadas de 1940 a 1980  e lamenta as três últimas, que teriam como características a estagnação e a desigualdade. Segundo Unger, haveria três marcas do projeto nacional desde os anos 1990: realismo fiscal, "pobrismo" e uma marcha ré do conteúdo produtivo da economia brasileira.
Não desperdiçarei espaço criticando o suposto "realismo fiscal". Qualquer um que acompanhe as finanças públicas nacionais sabe que isso não ocorreu.
 O tal "pobrismo"  se refere aos programas de  transferência de renda que não abririam oportunidades e capacitações para os mais pobres. A escolha do termo "pobrismo" é infeliz e sugere desprezo pela única política social de larga escala bem sucedida no Brasil. E Unger ignora que acumulam-se evidências dos efeitos positivos que vão além do resultado imediato. Quem dera o "pobrismo" tivesse sido adotado mais cedo...
O problema principal do diagnóstico do Professor está na crítica à suposta marcha ré do sistema produtivo brasileiro. De fato, o Brasil dos anos 80 tinha um parque industrial completo. Produzia da uréia ao toca-fitas CCE. A montagem desse parque acompanhou a modernização do Brasil nas quatro décadas de ouro do Professor Unger, mas teve altos custos. A sociedade teve que arcar com a ineficiência, generosos incentivos e investimentos estatais. O resultado foi a crise da dívida e a inflação alta que se seguiram ao esgotamento da substituição de importações.
Há um ponto ainda mais central. Justamente entre 1940 e 1980, os problemas por ele denunciados - desigualdade e formação de grandes grupos dependentes do Estado- se aprofundaram. Isso não foi uma criação das últimas três décadas. O Professor finge não ver a face perversa dos projetos nacionais fortes daquela décadas.
Sobre o setor agrícola, o Professor guarda uma visão que ecoa a dos grande intelectuais brasileiros até os anos 1960. Ou seja, ele ainda associa a agricultura com atraso. Nada mais equivocado. Um dado simples: desde 1975, a agricultura brasileira utiliza a mesma área plantada, mas quadruplicou sua produção . A bem da verdade, o Professor  Unger reconhece o papel da Embrapa, mas se incomoda com o fato da inovação ser da porteira para dentro. E daí? O Professor deveria se lembrar que Marx escreveu que a agricultura se transformaria em um ramo da indústria. Não há nada intrínseco à agricultura que a faça pior do que a indústria. O Professor não precisa se fiar na minha opinião ou na de filósofos alemães há muito  falecidos; basta visitar as áreas de agricultura dinâmica do Brasil. A inteligência brasileira, que o Professor tanto preza, lá gera seus melhores frutos.
 Passo às recomendações do Professor Unger. Ele oferece um amplo cardápio. Tal como nos restaurantes ruins, cada um achará algo que , ao menos no papel,  é apetitoso.  Há desde a recomendações para a reforma administrativa até para o  currículo escolar. Foco minhas críticas nas suas sugestões para qualificar o aparato produtivo.
De fato, Unger não propõe a volta da indústria antiga. Ele quer um salto baseado na economia do conhecimento. E como fazer isso? O Estado deve trabalhar "com as grandes empresas, sobretudo em setores em que já dispomos de vantagens comparativas … ou em setores em que há tudo ainda a fazer em matéria de produção avançada". Ou seja, precisamos promover os setores em que temos e os que não temos vantagens comparativas. Tenho sincera dificuldade de entender esse ponto. Além disso, será que os fracassos recentes da política de campeões nacionais nada nos ensinou?
No comércio internacional, Unger considera que a globalização é inimiga do seu projeto nacional forte. Nenhuma surpresa. Ele diz que é preciso um novo ordenamento da globalização que deixe de proibir "sob o rótulo de subsídios, as parcerias estratégicas indispensáveis entre governos e empresas".  Tal como fazia Leonel Brizola, a primeira liderança política da qual Unger se aproximou, o Professor desconsidera que o Brasil é um dos países mais fechados do mundo.
Em resumo, o novo projeto nacional forte proposto pelo Professor é terrivelmente semelhante ao que nos trouxe até aqui. Trata-se de uma atualização ao século XXI, mas comete os mesmos erros de outrora. É verdade que existem bons argumentos teóricos que justificam o protecionismo e a política industrial. Contudo, entre a teoria e a realidade, existem os grupos de interesse e os políticos. Eles são tão concretos quanto o prédio da Fiesp e os da Esplanada dos Ministérios. Seus interesses são bem diferentes dos do Professor de Harvard. Ao idealizar a capacidade do Estado brasileiro de implementar o seu projeto nacional forte, Unger ignora essa condição essencial.
O  parágrafo final do texto é ainda mais revelador:
 Para nós, que vislumbramos outro caminho para a nação e confiamos no engrandecimento dos brasileiros, a ser alcançado por meio da transformação das instituições e das consciências, a crise pode ser, além de trágica, fecunda. 
 Despido do arroubo retórico, Unger repete aqui os coaches contemporâneos e seus clichês ("vocês sabiam que o ideograma chinês 'crise' é  formado por 'risco' e 'oportunidade'?" e "vamos mudar o mindset!").  Mas há também  a promessa de "make Brazilians great" (again?)   e o desejo de mudar as instituições e  as consciências dos brasileiros. Se nos livros de  auto-ajuda essas visões são inofensivas,  elas se tornam perigosas para alguém que reconhecidamente propõe um "projeto nacional forte" e, ao mesmo tempo,  é próximo de lideranças políticas com chances reais de chegarem ao poder.
Hoje parte da direita celebra os avanços dos presidentes da  ditadura militar e parte da esquerda, os do ditador Getúlio Vargas. Esses líderes de outros projetos nacionais "fortes" foram hábeis em povoar o imaginário e as avenidas com os seus nomes. E, mesmo assim, o país é estagnado e desigual. Por que esperar que seria diferente da próxima vez? Paradoxalmente, no longo  prazo,  uma agenda focada em resolver as questões mais básicas da população tende a ser mais bem-sucedida do que ousados projetos "fortes" que seduzem Unger. A vida dos brasileiros melhoraria com liberdade, educação, saneamento e saúde de qualidade para todos. Quem sabe, Professor Unger, não devêssemos tentar essa estratégia?

Do Ipea para a Enap

Novidade: a partir de hoje, eu saio do cargo de coordenador de avaliação de políticas públicas do Ipea e vou para a Enap. Lá serei o coordenador geral de Ciência de Dados.
A Enap tem uma equipe sensacional e será um prazer (e um desafio!) trabalhar lá.

Skill concentration and persistence in Brazil por Ehrl e Monasterio

Texto novo do Philipp e meu na Regional Studies

"This paper links the past and present regional concentration of skills using the spatial distributions of occupations from the Brazilian censuses of 1872, 1920 and 2010. The data indicate that the concentration of top skills is highly persistent. Multivariate regressions show that regions with a high concentration of industrial and liberal occupations in the past have a high concentration of interpersonal, analytical and cognitive skills today. Moreover, it is observed that skill persistence seems to be positively related to market size. Controlling for natural advantages, the dependence on slave labour and immigration in the past does not undermine the relevance of the historical skill distribution"

Brasil, ame-o e deixe-o

Texto meu sobre as vantagens da emigração para o país de origem.

O Rateio do FPM Vis-à-Vis a Lei Complementar 165/2019 por Rocha e Freitas

Não há distorção brasileira que não possa piorar. Carlos Alexandre Rocha e Paulo Springer, consultores do Senado, mostram que a nova Lei Complementar piorou ainda as maluquices do FPM.

Inaugurando as edições da Consultoria Legislativa do Senado Federal em 2019, apresentamos o presente Boletim Legislativo, que aborda o rateio do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), dado pela Lei Complementar nº 165, de 2019. Recentemente foi aprovado e submetido à sanção presidencial o Projeto de Lei Complementar (PLP) nº 549, de 2018, cujo objetivo é resguardar temporariamente as cotas-parte dos municípios cuja população estimada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) tenha diminuído entre 2017 e 2018. A nova norma se soma a várias outras proposições, aprovadas, arquivadas ou em tramitação, relacionadas com o FPM – um tema recorrente nos debates parlamentares. O presente trabalho pretende oferecer subsídios para os debates, presentes e futuros, acerca do rateio do FPM. Deseja-se evitar que soluções transitórias, como no caso da lei enfocada, obscureçam a busca por soluções permanentes para os problemas estruturais desse rateio.

"Pesos Regionais: uma proposta para a repartição do FPM" por Guerreiro e Monasterio

Texto novo aqui. Aí vai o resumo:
O presente estudo aplica a metodologia dos pesos regionais de bem-estar social para a distribuição do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). Foram utilizados microdados do Censo de 2010 do IBGE com o fim de efetuar os cálculos dos pesos de bem-estar para os municípios brasileiros a partir de dois métodos: pela renda per capita e pelo EDEI (Renda Equivalente Igualmente Distribuída). Mostra-se que a distribuição do FPM observada não é espacialmente progressiva, enquanto a aqui proposta é mais equitativa, beneficiando os municípios mais pobres e desiguais. Essa aplicação da Economia do Bem-estar ilustra as potenciais aplicações da metodologia de pesos regionais para o desenho e a avaliação de políticas públicas.

Só autopromoção



Será que os eleitores gostam de políticas econômicas ruins?

Os três candidatos que lideram a corrida presidencial- Bolsonaro*, Ciro e Haddad- são populistas. Todos vendem fantasias de crescimento econômico sem ajuste.
Nessas horas, eu penso neste diálogo que a McCloskey narra na Chicado dos anos 1960.  Stigler argumentava que se as pessoas quisessem livre-comércio, elas o teriam. Já Friedman acha que é necessário educar as pessoas sobre o dano que as tarifas causam:




No Brasil, a tragédia do populismo é tão recente que não dá para dizer que as pessoas esqueceram os fatos. Por que as pessoas querem a repetição daquilo que deu tão errado?
Nos meus melhores dias, eu compartilho com o Friedman a fé na educação econômica. Já nos piores, eu fecho com o Stigler e penso que as pessoas gostam de populismo (assim como gostam de tarifas). A lógica é a seguinte: nós gastamos com cinema, música e literatura. Tudo para esquecer a chatice do mundo real. Da mesma forma, pode ser que o eleitor "pague" com maior instabilidade ou renda mais baixa o prazer da ilusão temporária do populismo. Ele se alimenta das fantasias megalomaníacas nacionalistas. Já uma boa política econômica é tão enfadonha quanto a realidade. 
(Claro que eu não tenho ideia do porquê do populismo ter suas idas e vindas, nem a razão de se dar tão bem na América Latina. Essa pergunta vai para os departamentos de Ciência Política ou Antropologia)

* Sim, Guedes é populista quando diz que vai arrecadar um quaquilhão com a venda do patrimônio da união.

O poder da diversidade

- Esta thread do Noah Smith sobre diversidade é ótima;
- O paper do Philipp Ehrl e meu sobre os efeitos de longo prazo da diversidade dos imigrantes no Brasil #AutopromoçãoDeslavada;
- Vejam os sobrenomes dos membros time campeão norte-americano na Olimpíada Mundial de Matemática: Lin, Singhal, Huang, Gu, Ren e Ardeishar. E o time é treinado por Loh e Rudenko.
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